"Vende-se tempo" - era a inscrição de uma placa logo em frente à loja da esquina.
Vendia tempo de todas as formas, tamanhos e cores: tempo multicolorido e retangular, grande, pequeno, em dúzias, em pequenas caixas, em saquinhos de papel. Vendia tempo aos montes e em grandes quantidades.
O estoque era interminável.Vendia-se tempo como se vende água.
Homens encoleirados em suas gravatas compravam caixas e mais caixas de tempo para suas famílias. Mulheres fúteis e plastificadas compravam tempo para seus filhos. E os filhos, universitários jovens e inseguros, compravam tempo para os estudos. Não preciso dizer que a loja era um sucesso.
Pessoas vinham de todas as cidades para comprar tempo. E não era tão caro, para felicidade de todos. As opções eram vastas. Era coisa de se ficar maravilhado!
Mas como seria possível vender tempo? Se os segundos não se alargam,os dias não se estendem para além das 24 horas e o passar dos meses e anos é sempre esta marcha certa, como dispor de mais tempo? Como obter mais minutos? Esta dúvida sempre assomava toda vez que eu via alguém entrar na loja e sair com uma caixa ou um pacote.
Até que eu mesma resolvi comparecer a esta loja e fiz questão de comprar uma pequena parcela do produto. "Quero 1 pacote de tempo para mim mesma" - pedi ao homem do balcão. E a caixa dentro da qual estava meu tempo era toda espelhada por fora. Genial. Resolvi abrir quando chegasse em casa. E quando olhei dentro da caixa, que surpresa!
Por isso não me admirei quando a loja teve de fechar as portas. Assim que vi o que tinha dentro da caixa, eu soube que alguém sem sensibilidade alegaria que fora vítima de propaganda enganosa. E assim aconteceu: um advogado engravatado - tinha que ser um deles- foi reclamar no Procon. A loja levou uma multa pesadíssima e teve de fechar.
Fiquei triste com esse episódio. Pessoas tão delicadas e de ideias tão geniais não mereciam ser penalizadas assim. Paciência. Depois de um tempo eu soube que eles abriram outra loja e, agora sim, não havia mais propaganda enganosa, embora vendessem o mesmo produto.
"Vendem-se agendas e calendários" - é a inscrição atual.
É uma loja de prioridades.