Após uma série de eventos que aconteceram em minha vida durante os últimos tempos, e de estranhas reflexões sobre eles e como se processaram, descobri qual o meu maior medo - e provavelmente o maior medo das outras pessoas.
Tenho um série de medos que coleciono com certa simpatia, até. Acredito que não pode haver algo pior para uma pessoa do que o medo de ter medos e a angústia que isso traz. Não ter medo é a mesma coisa que não ser humano e tentar negar essa condição é um passo em direção ao sofrimento.
Não que eu goste de sentar em uma poltrona de avião e suar feito um cuscuz, numa demonstração clara de que não estou nem um pouco à vontade naquele objeto enorme e pesado, que até hoje não sei como consegue voar (e, a este ponto, prefiro nem saber).
Tampouco me sinto satisfeita em sair correndo e gritando, histérica, quando um inseto qualquer decide que sou a pista de pouso perfeita para suas manobras.
Não...tenho vergonha, até.
Por um longo tempo eu pensei que entre todos os meus medos, o pior deles fosse o medo da morte - o que explica o medo de avião, pois a queda é um meio infalível de cruzar a ponte entre a vida e o que houver após ela.
A morte, na verdade, me angustia porque é triste deixar tudo isso aqui e porque, se não houver nada além dela, a morte é o fim de todo amor. Por enquanto "o fim" é algo que não consigo conceber: com ressalva da vida, nada se vai para sempre e tudo acaba sendo transitório e possível de acontecer novamente.
Depois de muito refletir, percebi que a morte não é o maior medo que possuo. Nem de longe.
Cheguei à conclusão de que meu maior medo seria o medo do novo, o qual pude experimentar por diversas vezes após uma reviravolta que a vida me impôs - e pela qual agradeço sempre. A própria morte, o maior dos mistérios, é a coisa mais inédita que testemunharemos. Não há ideias, filosofia, provas ou depoimentos de como ela seja. Há apenas a fé.
Sentir esse medo das coisas que se apresentam a nossos sentidos pela primeira vez é algo saudável e necessário: o medo é o motivo de a espécie humana ter chegado até aqui, após enfrentar - pela fuga ou luta - toda a sorte de infortúnios através dos tempos. As pupilas se dilatam, para que possamos enxergar melhor, o coração acelera para bombear mais sangue, garantindo mais energia aos músculos e o corpo todo se prepara secretamente diante do perigo.
Provavelmente era assim que eu estava quando tive de mudar de cidade, de trabalho, deixar meus amigos e familiares em outro estado e voltar a morar sozinha. Tudo ao mesmo tempo e implacavelmente.
É certo que teve solidão e sensação de vazio. Às vezes me surpreendia com perguntas a respeito de como meus pais descobririam que teria acontecido algo comigo, se acontecesse. E assim por diante...
Só que eu tenho essa mania de ver correlação em tudo e o fim do ano me abriu os olhos para uma possibilidade bastante animadora: e se o medo não tiver que ser assim? E se as coisas novas sejam melhores e necessárias para minha jornada? E se eu encarasse o novo como uma possibilidade de driblar a minha morte?
Clarice Lispector já dizia que somente aquilo que está morto é que não muda.
Aliás, não preciso nem recorrer a Clarice.
E se a gente usasse para o medo da mudança a esperança luminosa que usamos para o Ano Novo?
Seria espetacular se observássemos as mudanças - todas elas - com os olhos no futuro e com a esperança de dias melhores, mais prósperos, com mais saúde e felicidade, oportunidades de crescimento e de ser sempre mais grato à vida.
Viver é mudar a cada dia e não dormir o sono profundo da mesmice e do apego a situações confortáveis e infelizes.
Deixo aqui o testemunho de um amigo muito especial que já me confessou ter ultrapassado esse medo bobo de tudo o que é novo, não sem uma dose de esforço: "Mari, meu maior medo é olhar para trás e perceber que sou o mesmo Leo de 5 anos atrás, que não sou melhor nem aprendi mais nada e que penso exatamente da mesma maneira a respeito das coisas."
E foi assim que descobri o maior medo de que se tem notícia. Esqueçam os aviões, os insetos e até a própria morte: o maior medo é não mudar nunca.
Não vale a pena superá-lo.
Não vale a pena superá-lo.