Escrever deveria ser sempre esse caminhar no escuro da alma. Essa coisa assustadora que de repente se ilumina em alguma vereda do coração.
Escrever deveria aliviar a dor como um pensamento alegre. E não deveria haver pessimismo em escrever.
Se escreve, sobretudo, aquilo que se quer e, a não ser que o que se escreva seja uma carta suicida, nada pode ser escrito com tudo que há de ruim.
Nessas horas em que sem inspiração me desespero, em que penso sobre todas as coisas já escritas e busco um novo velho significado. Nessas horas é que deixo as palavras lançarem-se em tempestade sobre o papel branco, me propondo um rascunho que não pode ser consertado. Nessas horas é que deixo as palavras cumprirem sua sinas. Mostrarem-me porque vieram.
Talvez para acalmar as ânsias desse coração que tem sede. Talvez para afugentar todos os medos e me transformarem de dentro pra fora toda e de uma só vez. Talvez porque liberdade seja isso e as palavras precisam enfrentar a mesma desordem que meus cabelos sentem ao cair sobre o papel, formando uma senda através da qual vejo todo o resto.
Agora é que, engraçado, me vejo como um objeto pelo qual as palavras passam sem embaraço; algumas se rindo de mim, outras me provocando.
Percebo que acabo de escrever uma palavra em letra cursiva muito feia e que já nem sei o que era nem o que eu mesma queria dizer.
Não me importa: basta apenas seguir o fluxo do branco no papel, onde já se formam sombras do que foi escrito no verso.
Importante esta missão de poder escrever sem pensar, tão diferente do dia a dia em que sequer nos permitimos amar sem pensar - logo amar, que apaga qualquer vestígio de raciocínio.
Pois continuo escrevendo em assombrosa velocidade, deixando que gritem as palavras a liberdade que não encontraram em mim. Elas, que até então estavam enclausuradas nesse peito. Voem! Cantem! Assustem!
Nenhuma delas é minha, em verdade sinto como se tivesse acabado de psicografá-las: uma luz misteriosa sobre minha cabeça ilumina o que se escondia na alma. A cabeça pende e o corpo dança, estático apenas por fora. Talvez o corpo é que não esteja tão acostumado a deixar fluir e por isso o estranhamento. Mas o coração está.
Foi ele que escreveu agora.
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