Em um dia ensolarado e limpo fomos (re)visitar uns povoados da zona rural de minha cidade. Poeira na estrada, mandacarus na paisagem inteira e aquele barro vermelho que fica na bota e na alma de quem viaja pelo sertão.
Chegamos a um povoado próximo à antiga roça do meu pai, que eu apenas aproveitei na minha primeira infância. O lugar tem um descampado imenso, casas ao redor em formato de "U' e beleza, muita beleza. O sol, quando se põe lá, parece que leva tudo que pode haver de ruim no mundo, deixando o ar impregnado de pureza e ingenuidade.
Batemos na porta da casa de uma família amiga. Apenas a esposa lá dentro. Aquele rosto espantado e feliz ao mesmo tempo.
- Menino, mas são vocês! Quanto tempo! Vamos entrando e não reparem a bagunça não. O Zé saiu ali mas já tá voltando. Querem uma aguinha?
Eu, mesmo sem sede alguma, aceitei. E fiz questão de ir buscar a água no pote de barro. Tirei a tampa e aspirei aquele "cheiro de água". Bebi, sentindo o gosto da água salobra.
Sentamos à mesa da cozinha e meus pais começaram a conversar com ela. Então minha mãe perguntou:
- E cadê sua filha, comadre?
- Oxe, não soube não?
- Não!
- O namorado "carregou"...
- Ah, entendi...
Eu é que não havia entendido nada daquilo. Sequestro? Fuga?
Só depois que saímos de lá é que minha mãe me explicou a história toda.
A filha da comadre namorava um rapaz, ao qual dedicava muito amor. Ele também a amava e queria a todo momento estar junto dela. Só que as famílias demoraram muito em ajeitar o casamento. Então, numa noite de lua cheia, cansados da espera, o namorado foi até o quintal da casa da namorada, a pegou pela mão e a "carregou" para a casa dele.
O detalhe: eles eram vizinhos.
Depois que a família da moça percebeu que ela não havia passado a noite em casa e que provavelmente o amor tinha se consumado, nunca mais questionou seu casamento.
E eu, invejosa que sou, fiquei a pensar em como deve ser bom morar num lugar em que ainda dá pra se deixar carregar pelo amor e depois não precisar dar mais nenhuma satisfação pros outros.
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