quarta-feira, 22 de maio de 2013

Escrevendo música.

Era um desses dias normais e corriqueiros em que tudo parece se ajustar ao que esperam de nós. Nenhum sorriso novo me encontrou na rua. Nenhum rosto desconhecido ficou em minha memória. Nada. Nem um pontapé da vida! Nenhum suspiro diferente. Nenhuma saudade especial. Só um desses dias em que a gente trabalha, come, se cansa e depois dorme em vez de ser útil, deliciar-se e ter sonhos alados.

Mais um dia sem expectativa. Cansaço de uma semana pesando sobre os ombros. Almoço que não ocorreu e foi transformado em jantar, que, igualmente, restou precluso. E ao chegar em casa tudo reclamava comida e cama, como se somente disso fosse feita a vida. Era, em verdade, um dos dias que não vemos passar. Um dia ensaiado, coreografado, sem a dança rítmica do improviso e do acaso que não podemos governar.

Recusei-me a isto. Não vivi até aqui para ver desperdiçado um dia inteiro do qual sentirei imensa saudade mais adiante, quando já puder me dar ao luxo de ser nostálgica e apenas observar o tempo passar. Fazer algo diferente ainda hoje, mesmo faltando poucos minutos para a meia-noite e, portanto, para um novo dia. Novamente, recusei-me. Neguei. Ia fazer um chá, coisa não muito usual, mas deu preguiça. Sofá. Computador. Ambos negam minha vontade do diferente. Pensei em escrever? Sobre o quê?

Decidi escrever uma música.

Explico. É óbvio que as pessoas normais como eu só podem mesmo escrever letras de músicas, porque escrever música é coisa pra quem entende de partitura - algo que um dia ainda saberei fazer porque acho incrível! Como ainda não sei, decidi escrever uma música para a qual ainda não existe letra. A música que escrevo é uma chamada "Violin Romance", de Bethoven e precisei fechar os olhos para traduzi-la.

É mais ou menos assim:

O som doce de um violino.
Solitário, qual um amante esperançoso. Nem tão alegre que chame atenção, nem tão triste que mereça pena.
A ele junta-se outro, em coro.
Formam uma serenata.
Alguém vem assistir? Não se sabe.
Suspense. Vem ou não vem? Abrirá a janela para ouvir o som do amor contido?
Veio!
Abriu a janela, lépida e fagueira, com um sorriso iluminado pela luz de uma vela.
Nenhuma voz foi pronunciada. Apenas o violino continua a declamar algo.
Tudo mais rápido agora.
O pai dela vem vindo, talvez.
Suspense, igualmente.
Abriu-se outra janela.
Uma pessoa zangada olha a cena.
Até que uma mãe suave pousa sua mão na do homem, como que a pedir calma.
"Deixe os jovens amarem como fizemos no passado" - parece dizer ao esposo.
A filha, do alto, deleita-se.
No espaço entre ela e a serenata, ouve-se o silêncio das coisas que não precisam ser ditas.
Música mais grave.
Haverá algum impedimento?
"Casemos, então!
Em meio à turbulência um pedido em violino.
Medo.
Mas a resposta? Será um sim?
O violino passa a argumentar.
"Olha, você sabe que é somente por você que eu canto".
Súplica em música.
Amor em notas.
Um sim.
Calmaria.
E tudo acaba.
Ou começa.

Nenhum comentário:

Postar um comentário