Esses dias eu me peguei pensando em "coisa julgada". Coisa julgada. Tem algo mais chato e inútil do que o termo "coisa julgada"? É algo que já foi julgado. Já era. Depois da coisa julgada o negócio é chorar no pé do cabôco. Mas a coisa julgada tem implicações. Tem limites objetivos e subjetivos. Tem consequências jurídicas. E me peguei pensando na existência concomitante de duas coisas julgadas. O mesmo fato foi julgado de maneiras diferentes. E aí? O que prevalece?
Você, que nunca se viu pensando em coisa julgada, não sabe o quanto a situação é ultrajante. Às vezes eu acho que todo mundo deveria ter o direito de colocar uma vassoura virada de cabeça pra baixo atrás da porta do pensamento, pra ver se espanta esse tipo de coisa indesejada. É como se fosse preferir salada a batata-frita, sendo que o único critério é o gosto. É sabotagem.
Por isso mesmo, quando eu, deitada às 23h36 do dia 13, me vi pensando em coisa julgada e procurando na memória a matéria "Conflito entre coisa julgada", quase desisti de mim mesma. Absurdo! Onde já se viu, pensar em coisa julgada uma hora dessa da noite? Coisa julgada? Tanta coisa mais interessante pra pensar, pra supor, imaginar, falar - sim, eu tenho diálogos longos e construtivos comigo mesma. Tantas cenas pra ensaiar - sim, eu "ensaio" as conversas que terei com as pessoas, ainda que elas não tenham recebido cópia do script - e eu ali pensando em coisa julgada no mais absoluto desperdício de tempo da minha vida.
Talvez quando eu esteja bem velha ou até mesmo se eu morrer jovem, naqueles poucos momentos antes de falecer, eu vou pensar: antes eu tivesse usado aquele tempo, em vez de pensar em coisa julgada. Talvez a vida até me reserve um futuro profissional cheio de coisa julgada, mas com certeza ela não ocupará mais meu pensamento. Não à noite, no horário em que todo cristão coloca a cabeça no travesseiro e pensa no que quiser.
E eu podia pensar em tanta coisa!
Eu podia pensar no meu sonho (agora meio abandonado) de ser atriz/cantora/modelo/jornalista da Globo - porque de outra emissora não serve. Eu podia pensar em ir aos Estados Unidos e trabalhar numa loja de fast food, onde todos ficarão embasbacados com a minha fluência no idioma e um americano muito legal se apaixona por mim após eu acertar no seu pedido com muito bacon. E esse é o momento em que eu começo a conversar sozinha em inglês, o que muito me deixa animada porque só uso o vocabulário que eu conheço, óbvio, me dando a impressão de que eu sou fera no inglês.
Eu poderia usar o tempo pra pensar no que eu vou fazer com o dinheiro quando eu ganhar na mega sena, mas esse pensamento eu já descobri que é inútil enquanto eu não começar a jogar na loteria, então talvez seja melhor pensar em algo mais rentável e possível, tipo eu conhecer um olheiro de cantores, que descobriria este meu talento desconhecido e me levasse pros palcos. Aí eu seria famosa, usaria roupas cheias de brilhos e faria um dueto com Roberto Carlos. Mas aí eu seria a Paula Fernandes e eu tenho muita agonia dela, porque parece que ela tirou uma costela. Seria eu, só que famosa.
Talvez eu devesse usar aquele tempo pra pensar no que vou fazer depois de formada, mas isso era chato!Também tem o lado ruim de ter que me fazer pensar que tenho que começar a estudar de verdade pra um concurso e saber coisas chatas, como coisa julgada. A cabeça da gente deveria fazer uma triagem antes de pensar: só coisas boas/improváveis/sonhadoras e que demandassem bastante imaginação poderiam prevalecer lá na mente. Responsabilidades, taxas, imposto de renda, ônibus, trabalho, estágio, futuro profissional: tudo isso só devia ser pensado na hora certa, não às 23h de uma noite de quinta-feira.
Mas, pensando bem, acho que não foi de todo ruim pensar nisso. É péssimo porque eu não descanso enquanto eu não lembro de algo, mas foi até bom porque me fez ficar mais atenta a esse tipo de armadilha montada pela cabeça. A partir daquele dia eu jamais me permiti dormir logo após pensar em coisas assim: chatas, sérias e julgadas. Não, nunca mais. Hoje talvez eu pense na minha viagem pra Europa. Ou na minha volta pra o interior. Talvez eu pense em como eu queria ir pra praia amanhã. Talvez eu pense no que eu podia dizer às pessoas. Talvez eu pense em você, que está lendo. Talvez em mim, mas não necessariamente.
O bom do pensamento é que sempre nos dá uma segunda chance, embora eu não possa dizer o mesmo do tempo. Este é implacável, mas quer saber? Necessário. Não fosse o tempo e sua passagem silenciosa, eu jamais me arrependeria de pensar em coisa julgada e talvez até continuasse indefinidamente pensando nisto. Há pessoas assim.
Pode parecer desespero esse negócio de não querer perder tempo nem com pensamento, mas pra cabeça de quem tem imaginação, o que se pensa é vivido. Nem que seja naquele cantinho da cabeça, a gente vive, sente, fala. Se for coisa boa, suspira depois do pensamento e torce pra virar verdade. Se for ruim, se arrepende. O negócio é se condicionar. Meu problema já resolvi: as vassouras estão atrás da porta.
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